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Robespierre de Zlavoy Zizek

  • Marcos Nicolini
  • Jun 25, 2023
  • 3 min read

Resignificando, desconstruindo a realidade da Revolução Francesa a partir da reimaginação de Robespierre e do momento revolucionário, o qual chama de democracia, Zizek pergunta:


“Existem dois lados elementares e irredutíveis na democracia: a violenta imposição igualitária daqueles que são ‘supranumerários’, a ‘parte da não parte’, aqueles que, embora incluídos formalmente no edifício social, não tem um lugar determinado dentro dele; e o mais (mais ou menos) regulado procedimento universal de escolher aqueles que vão exercer o poder. Como esse dois lados se relacionam um com o outro? E se a democracia no segundo sentido (o procedimento regulado de registrar a ‘voz do povo’) for, em última instância, uma defesa contra ela mesma, contra a democracia no sentido da violenta intrusão na lógica igualitária que perturba o funcionamento hierárquico do edifício social – uma tentativa de refuncionalizar esse excesso, fazê-lo parte do fluxo normal do sistema social? O problema é como regulamentar/institucionalizar o próprio impulso democrático igualitário violento, como impedi-lo de ser afogado em democracia no segundo sentido do termo (procedimento regulado)? Se não existe forma de fazê-lo, então a democracia ‘autêntica’ permanece uma momentânea explosão utópica que, na proverbial manhã seguinte, terá de ser normatizada.” (Zizek, Robespierre, pg. 36)



Primeiro devemos situar a leitura de Zizek a partir de Walter Benjamin, o qual é citado no transcurso de sua releitura de Robespierre. Benjamin trata de realizar uma cisão (bem ao modo sacrificial, separando a parte dos deuses e dos homens) entre a violência tout court e violência divina. A primeira é aquela que vivenciamos nos cataclismos e, sobretudo, nas sociedades capitalistas-burguesas; a segundo é a violência determinada por um movimento revolucionário, uma violência do bem, que é justificada por fazer emergir no futuro a igualdade e a humanidade. Hoje apelamos para a metáfora do ódio do Bem e ódio do Mal.


Neste sentido, então, a violência realizada na Revolução Francesa, Russa, Chinesa, Cubana, com os extermínios em massa e os tribunais que ajuizavam antes do julgamento, não são passíveis de julgamento, pois o juízo é dado por uma esperança vindoura, aquela que diz que num futuro distante a História inocentará os violentos, pois eles trouxeram ao possível a utopia esperada. Não são passíveis de ajuizamento pois já estão, de antemão, inocentados pela justiça vindoura.


O segundo elemento Benjaminiano que está presente, ou subjacente nesta redescrição, neste revisionismo histórico é que a Revolução é marcada por dois momentos: da instauração (violência) e na institucionalização (normatização): criação e ordem. De fato há duas formas de violência revolucionária, aquela da explosão revolucionária, caótica, e aquela da imposição da ordem legal que transfere o poder dos revolucionários para a nomenclatura, para a burocracia. O primeiro momento é leninista, o segundo é stalinista. O revolucionário que comete o erro crasso de manter-se em revolução será eliminado pelo establishement. O establishement, a nomenclatura, a burocracia reintroduzem as hierarquias, os interditos, a ordem fundada naquilo que é o fundamento da revolução: a violência.


Assim, os dois lados que evoca Zizek, são dois momentos lógicos e cronológicos da Revolução. Os revolucionários devem ser eliminados pela Revolução, tanto quanto os derrotados. Esta extirpação revolucionária dos revolucionários faz parte da mesma lógica revolucionária: a violência do Bem. Uma Revolução que não trai a si mesma não se realiza como tal. O momento subsequente e lógico da Revolução é se tornar Conservadora.


O fato, negado e esquecido por Zizek, é que não há a Revolução e nem o acontecimento político crucial. A dita Revolução Francesa foi, de fato, um levante popular que não desejava dar fim à monarquia, mas opor-se à violência monárquica. Foram os intelectuais que sequestraram a manifestação popular e a tornaram em um odioso acontecimento de assassinato generalizado. A Revolução foi produto da caneta e não das foices e garfos. A não parte continuou excluída assim que sua utilidade assassina deixou de ser necessária. Logo após, os revolucionários também foram eliminados.


A questão crucial da Revolução em conformidade com o que é pelas penas e tintas em papéis postos como tábulas rasas é que as pessoas não se alimentam de atos políticos e de cortar cabeças em guilhotinas. O fato é que a estabilidade é agente propulsor da possibilidade de maximização da eficiência a qual promove o sentido prometido e incumprível da ação revolucionária, a saber, o bem. O bem comum exige a presença da manutenção da estabilidade, ainda que esta não seja suficiente. As utopias revolucionárias apenas dão respostas aos sonhos monstruosos de escritores que não estão dispostos a abandonar a tranquilidade de suas extensas bibliotecas e seus contínuos espaços de contemplação e escritura. Insuflam enquanto exigem silencio contemplativo e analítico.


Por fim, a Revolução se tornou dínamo de uma nova era: a era disruptiva, da novidade como estilo de vida. Não há mais revolução, pois tudo e disrupção. Num mundo onde tudo muda, nada mais pode mudar: viva o niilismo revolucionário!

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