Χριστιανική Πόλη
- Marcos Nicolini
- Jun 24, 2023
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Premissas:
1 – E criou Deus o humano (ad’ham: homem ou humano) a (deveria ser à, mas aqui está uma sutil mudança semântica que implica numa sugestiva alteração de sentido) imagem e semelhança de Deus;
2 – Venha o teu reino (basiléia, donde basileus é rei);
3 – O reino (basileia) está entre nós.
4 – Desde os dias de João Batista até agora, o reino (basileia) dos céus é tomado à força, e os que usam de força se apoderam dele.

Conclusões
A - Para os neoplatônicos (pensamento advindo do Platão e que está presente nos primeiros séculos da era cristã) haveria um encadeamento dos seres desde o Ser até o não-Ser que seria estabelecida pela presença do Ser nos entes, de modo hierárquico, completo e imutável. Assim, quando se confunde o Ser com Deus, haveria a presença divina em cada ente, inclusive o humano. Para alguma tradução judaico-cristã, há uma descontinuidade entre o Criador e as criaturas de tal modo que não há tal continuidade entre Deus e os entes criados, inclusive o humano. No entanto, o texto do Gênesis é lido como se o humano fosse uma criatura à parte da criação e Deus pudesse ser visto no mundo a partir deste ser criado em contiguidade.
Quando dizemos que “Deus criou o homem a imagem e semelhança” conferimos este sentido de presença divina no homem, ainda mais, o homem é identificado com Deus pela imagem e semelhança, de tal modo que o homem se sobressai por ser criatura que é imagem do criador, porta o “DNA” divino em si. A máxima identidade, contudo, é fruto da imaginação e idealização valorativa. Contudo, se dissermos que “Deus criou o homem à imagem e semelhança” podemos pensar numa escatologia, num vir a ser como convite.
B – O reino de Deus como uma política ou como uma a-politica? A ideia de um Reino como política está presente nos Progressistas e nos Conservadores, digo, não apenas no sentido laico como, mormente e primário, no sentido religioso. A ideia básica de que a natureza, ou, a materialidade da existência humana pode e deve ser sacralizada por meio de uma mudança nos valores e instituições que a fundamenta está presente nas teologias de nossos dias. O reino de Deus como política exige a definição de um inimigo a ser tanto aquele que impede a presença do bem, da justiça e da paz, como arregimenta forças e recursos para dar significado a uma guerra espiritual contras os poderes do mal, da injustiça e da guerra. Isto nada mais é do que fazer política: instituir a guerra pelo poder.
C – Aqueles que compartilham da imagem divina em si, que são a presença de Deus no mundo, podem e devem produzir mundo como um advento do céu na terra. Neste sentido, haveria uma comunidade de fé (fé em que tal comunidade representa Deus no meio de uma natureza decaída pelo presença do mal) que está imune ao mal e imunizada pelo bem. Tal comunidade de imunizados traz em si e consigo o poder divino de realizar a sacralização do mundo. O mundo não é mal, mas está sob o domínio de um poder maligno (imperium) o qual ao ser destituído, ou melhor, por sua destituição e destruição será inaugurado um reino de bem, justiça e paz, politicamente realizado. O Evangelho é uma boa-nova que se dá politicamente, ou como política divina.
Apelando para uma citação, lembraremos que: “O erro capital do cristianismo veio do platonismo, que (para os cristão que o adotaram) concebia que o Bem devia ser um poder no mundo. Identificando-se a si mesma com esse poder, a Igreja inevitavelmente se tornou repressora da diversidade humana. O platonismo e, logo, o cristianismo alentaram uma falsa ilusão a propósito da natureza do valor.” (John Gray, 7 tipos de ateísmos, Ed Sextopiso, pg 176)
D – A política é, em sua raiz uma ordem presente em meio a uma cidadela em guerra, como nos diz John Milbank em conversa com Slavoy ZIzek: guerra contra inimigos externos (os outros) e internos (nossas heranças degeneradas). O mal antevemos nos outros, que não são outros mas degradações da humanidade e perversos que desviam a verdadeira humanidade de seu destino como salvação. O mal que vemos em e entre a comunidade dos imunes, presenças da degeneração humana e herança de resquícios de sub-humanidade como vícios redibitórios. A política é guerra, batalha, luta, confronto de ordem espiritual, isto é, superior ao nível individual. Na guerra busca-se a eliminação, erradicação do outro, mais em sua representação de uma realidade degenerada e degradada, que degenera e degrada, e menos (mas se preciso for também de extirpa o infiel) do outro como indivíduo.
O evangelho deixa de ser uma ressignificação de uma boa-nova apregoada pelos dominadores, pelo Imperium e torna-se uma carta de direito de apropriação da alteridade em ensimesmamento. O evangelium se torna a carta do exército dominador que subjuga o diferente em submissão identitária. O evangelho se torna uma política, quer por meio da carta progressista, quer por meio da carta conservadora. O evangelho é guerra e os fortes usam de violência a fim de realizá-lo no mundo, o qual por meio desta presença sagrada salvam o mundo. Dar o dízimo a Deus é dar o dízimo a Cesar, e vice-e-versa.
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